DELINEAMENTO DAS DOENÇAS TROPICAIS NEGLIGENCIADAS NO
BRASIL E O SEU IMPACTO SOCIAL
DESIGN OF NEGLECTED TROPICAL DISEASES IN
BRAZIL AND ITS SOCIAL IMPACT
Thaynara
Sarmento Oliveira de Almeida[1]
Thassiany
Sarmento Oliveira de Almeida[2]
Salomão
Nathan Leite Ramalho[3]
Recebido em: 19/09/2017.
Aceito em: 30/11/2017.
RESUMO
A carga de doenças tropicais é desigualmente distribuída
no mundo, onde as pessoas menos favorecidas compartilham uma elevada parte
dessa carga. Grande porcentagem pode ser atribuída a doenças tropicais
negligenciadas, as quais compreendem dezessete condições médico-sanitárias
diferentes. Dentre elas, a
dengue pode afetar todos os níveis da sociedade. No entanto, a carga é mais
frequente entre a população menos favorecidas. Nessa temática, a presente
pesquisa objetivou averiguar quais são doenças as tropicais
negligenciadas no Brasil e seu impacto social. Trata-se de uma revisão de literatura, na qual foram selecionados artigos
científicos, publicados nos últimos anos (2009 até 2015) nas bases de dados MEDLINE-NLM, MEDLINE-EBSCO, Scopus da Elsevier e SciELO. Como descritor foi utilizado: doença
negligenciada e sua respectiva tradução em inglês (Neglected Diseases). Os dados estatísticos mais proeminentemente
elevados sobre os agravos de algumas doenças negligenciadas referem-se a
Dengue, Malária e Tuberculose. As estatísticas envolvem, pelo menos, dois bilhões
de pessoas ocorrendo em mais de 90 países (quase 50,0% do total de países no
mundo). A dengue tem acometido pessoas de ambos os gêneros, contudo as
incidências são maiores em mulheres do que em homens. Devido à importância
crescente das doenças tropicais negligenciadas os esforços devem ser praticados
por sociedades e redes para treinar e informar os profissionais de saúde e a
população sobre a prevenção, diagnóstico, tratamento e gestão de doenças
negligenciadas.
Palavras-chave:
Doenças Negligenciadas. Saúde pública. Dengue.
ABSTRACT
The load
of tropical diseases, and unequally distributed in the world, where such underprivileged
people share a large part of that load. A large percentage can be attributed to
neglected tropical diseases, which comprise seventeen different
medical-sanitary conditions. Among them, dengue can affect all levels of
society. However, the load is more frequent among the underprivileged population.
In this theme, the present research aimed to find out what are the neglected
tropical diseases in Brazil and their social impact. This is a literature
review, in which the scientific articles published in the last years (2009 to
2015) in the MEDLINE-NLM, MEDLINE-EBSCO, Elsevier Scopus and SciELO databases
were selected. As descriptor was used: neglected disease and its respective
English translation (Neglected Diseases). The most prominent statistical data
on the aggravations of some neglected diseases refer to Dengue, Malaria and
Tuberculosis. Statistics involve at least two billion people occurring in more
than 90 countries (almost 50.0% of the total number of countries in the world). Dengue has affected people of both sexes, but the
incidence is higher in women than in men. Due to the growing importance of
neglected tropical diseases efforts should be undertaken by societies and
networks to train and inform health professionals and the population about the
prevention, diagnosis, treatment and management of neglected diseases.
Keywords: Neglected diseases. Public health. Dengue.
A carga de
doenças infecciosas é desigualmente distribuída no mundo, onde as pessoas
pobres compartilham uma elevada parte dessas mazelas. Grande porcentagem pode
ser atribuída a doenças tropicais negligenciadas, as quais compreendem
dezessete condições médico-sanitárias diferentes (WHO, 2013).
Por estas serem males predominantes em países
subdesenvolvidos e com condições precárias de vida, onde há pessoas sem acesso
a água tratada e saneamento básico, estima-se que as doenças tropicais
negligenciadas estão presentes em 149 países, atingindo cerca de um bilhão de
pessoas. Tais enfermidades prejudicam principalmente as crianças, afetando seu
rendimento escolar, mas também os adultos, que, quando acometidos desses males,
ficam desabilitados a exercerem suas atividades, acarretando consequências
econômicas (VANLERBERGHE; VERDONCK,
2013).
Segundo a
Organização Mundial de Saúde (OMS), essas doenças ocorrem principalmente nos
trópicos, devido às condições climáticas quentes e úmidas. Ainda de acordo com
a instituição, os piores índices de mortalidade causada por esses males são os
de crianças em países subdesenvolvidos, devido às más condições de higiene,
saneamento e água potável (CAMARGO, 2008).
A área de doenças negligenciadas tem sido considerada como
prioridade pelo governo do Brasil, que instituiu o Programa de Pesquisa e
Desenvolvimento (P&D) em doenças negligenciadas, focado em sete doenças:
dengue, doenças de Chagas, leishmaniose, hanseníase, malária, esquistossomose e
tuberculose (BRASIL, 2008).
Dentre as supracitadas merece destaque a dengue, transmitida ao homem através do Aedes aegypti que é um mosquito presente
em todas as áreas tropicais e subtropicais. As pessoas são infectadas com o
vírus durante as suas atividades diurnas e noturnas, uma vez que a transmissão
pode ocorrer em diferentes lugares: em casa, no trabalho, na escola e nas áreas
públicas. (VANLERBERGHE;
VERDONCK, 2013).
A dengue pode
afetar todos os níveis da sociedade (FLAUZINO; SOUZA-SANTOS; OLIVEIRA,
2009). No entanto, a carga é mais
frequente entre a população de menor renda porque vivem em comunidades com
infraestrutura sanitária inadequada, onde as condições são mais favoráveis para a multiplicação do vetor (MONDINI;
CHIARAVALLOTI-NET, 2008). Além
disso, há uma eficácia diferente em termos de equidade, quando as intervenções
de saúde são implementadas a nível populacional. As intervenções são menos
eficazes em populações desfavorecidas devido a barreiras de implementação
(menor acesso a informação ou falha na cobertura). (TUGWELL et al., 2006 apud VANLERBERGHE; VERDONCK,
2013).
Nos últimos anos, no cenário internacional, tem havido
debates sobre as formas de prevenir, combater e erradicar as doenças tropicais
negligenciadas, bem como pesquisas para desenvolver novos fármacos que ajudem
no tratamento dessas enfermidades (VANLERBERGHE;
VERDONCK, 2013).
Nesse cerne, o
objetivo do presente artigo constitui-se em averiguar o panorama mundial da
dengue, tendo em vista as populações mais frequentemente atingidas, os
determinantes sociais e os programas de saúde pública, avaliando as estratégias
mais justas, eficazes e rentáveis de prevenção e tratamento. Neste artigo,
discutiremos alguns pontos críticos sobre uma estratégia de controle que se
aplica a taxa de dengue, doença negligenciada mais importante no mundo, segundo
relatório da Organização Mundial de Saúde (AAGAARD-HANSEN, J; LISE
CHAIGNAT, 2010).
Consiste em averiguar quais são as doenças tropicais
negligenciadas no Brasil e seu impacto social.
Identificar quais são as doenças tropicais negligenciadas
emergentes e reemergentes mais comuns em países subdesenvolvidos e descrever as
principais características e perigos dessas doenças. Além disso, objetiva identificar
estudos que apontem a razão homem/mulher e a faixa etária dos pacientes
acometidos pela dengue, assim como discutir as medidas tomadas pelos governos e
entidades internacionais de saúde para combater o avanço dessas doenças.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
As doenças
tropicais negligenciadas são quase que exclusivas de países
subdesenvolvidos, onde existem pessoas vivendo com menos de um dólar por dia e
que são vulneráveis à infecção por essas enfermidades. Os efeitos desses males
podem ser vistos de forma direta e pelas taxas de morbidade e mortalidade, como
também na educação e na economia, que também são afetadas. Nas doenças
tropicais, há certamente um forte componente de subdesenvolvimento, consequência
tardia do colonialismo, mas há também certa fatalidade tropical, consequência
da heterogeneidade das evoluções geológica e biológica. No Brasil, as pessoas
mais susceptíveis a ter essas doenças vivem nos subúrbios das grandes cidades e
na zona rural, áreas com maior índice de subdesenvolvimento. Diante disso, o
Ministério da Saúde sempre realiza campanhas para tentar prevenir essas
enfermidades, por meio de publicidade. Entretanto, os índices de vítimas fatais
de doenças como a dengue ainda aumenta (CAMARGO, 2008).
Doenças tropicais
negligenciadas
O compromisso de controlar ou eliminar até 17 doenças tropicais negligenciadas em 2020 oferece uma
possibilidade para uma vida mais saudável e um futuro melhor para as
comunidades mais pobres do mundo. Além disso, um número crescente de
países tem adotado a eliminação da malária em resposta ao programa de
eliminação global da malária (FEACHEM et al., 2010; NAJERA et al., 2011).
Com o apoio da OMS, alguns países estão reforçando o trabalho para a eliminação
local de alguns das principais doenças tropicais, bem como estão contribuindo
para a erradicação global da outras (ANDERSON et al., 2012; LEE et al., 2012).
Estima-se que, a cada 30 segundos, morre na África uma
criança com malária. Segundo a OMS, cerca de 100 países no mundo são atingidos
pela doença, que infecta 216 milhões de pessoas todos os anos. A cada ano a
malária mata aproximadamente 2 milhões de pessoas e infecta cerca de 500
milhões, sendo que 80% das mortes ocorrem em lactentes e crianças jovens.. A
transmissão da malária se dá pela picada do mosquito anefelino infectado. Caso
tratada na fase aguda, a doença tem cura, mas já existem casos de resistência
aos medicamentos mesmo nessa fase (BILLIG et al., 2012).
Outra doença tropical negligenciada é a dengue. Ela é
transmitida pelo mosquito Aedes aegypti
contaminado, e que vem se alastrando mais rapidamente a cada dia. Essa doença
já foi considerada erradicada, mas retornou com toda a força: em 2002, foi
registrado o seu maior surto no país, com 800 mil casos. Dos quatro sorotipos
do vírus da dengue conhecidos, o mais grave é o hemorrágico que, se não for
tratado, pode levar o indivíduo a óbito (SINGHI;
KISSOON; BANSAL, 2007).
O termo dengue
refere-se a uma doença febril aguda causada por um dos
cinco sorotipos do vírus da dengue transmitidos por artrópodes e é
caracterizado como uma doença "velha" que ressurgiu na última metade
do século XX (BÄCK; LUNDKVIST, 2013; NORMILE, 2013).
A infecção pode levar à febre hemorrágica da dengue e, em alguns casos
graves, como naqueles que sofrem de síndrome do choque da dengue, pode levar à
morte (OMS, 2010). Os sintomas mais comuns são febre alta, dor de
cabeça, dor abdominal, mialgia e artralgia; em casos graves de dengue
hemorrágica e choque, os sintomas são acompanhados por trombocitopenia, derrame
vascular e hipotensão (BÄCK;
LUNDKVIST, 2013).
Dengue e suas consequentes manifestações
clínicas e sociais são consideradas um problema de saúde pública, e devido à sua
apresentação indiferenciada pelo aparecimento precoce em aproximadamente metade
dos casos, pode ser difícil de diagnosticar (NORMILE, 2013). O vírus da
dengue infecta entre 50 e 100 milhões de pessoas a nível mundial, tem uma
distribuição geográfica em mais de 125 países, sua incidência aumentou 30 vezes
nos últimos 50 anos, representa uma das principais causas de hospitalização e
mortalidade infantil, e é endêmica em todas as regiões da OMS, exceto na
Europa (OMS, 2010).
Dengue floresce em regiões tropicais e
subtropicais, e estima-se que 40% da população do mundo habitam áreas onde
ocorre transmissão (TORRESI;
TAPIA-CONYER; MARGOLIS, 2013). É especialmente
prevalente em ambientes que têm pouco ou nenhum sistema de gestão de água e
saúde pública, levando a reprodução descontrolada do mosquito vetor (OMS,
2010; NORMILE, 2013).
Segundo a OMS, surtos de dengue estão
aumentando em frequência e expansão geográfica, mesmo tendo em conta a
subnotificação, o que tenderia a subestimar significativamente a gravidade e
impacto real. A OMS identificou dengue, portanto, como uma prioridade de
saúde pública internacional (OMS, 2010). Na verdade, modelagem de
vigilância da doença recente estimou que a incidência anual global poderia
estar mais perto de 390 milhões, cerca de três vezes maior do que as
estimativas da OMS correntes (NORMILE, 2013).
Para complicar ainda mais este desafio,
um quinto novo sorotipo do vírus da dengue foi relatado no final de 2013,
confundindo os esforços para desenvolver uma potencial vacina que pode
efetivamente proteger contra todos os tipos da doença (NORMILE, 2013).
Como é uma doença tropical negligenciada, o ressurgimento da dengue ou a
emergência está ocorrendo em muitas regiões mais pobres com nenhuma experiência
anterior na prevenção, combate, ou controle (SHEPARD; UNDURRAGA; HALASA, 2013).
A América Latina tem experimentado um aumento
constante dos casos de dengue e a hemorrágica desde 2003 (TORRESI; TAPIA-CONYER; MARGOLIS, 2013). Alguns fatores específicos levam ao aumento dos surtos:
rápida urbanização, o aquecimento global / alterações climáticas, a falta de
controle de vetores, a saúde pública fundamental e falta de saneamento básico e
pobre armazenamento doméstico de água higiênico (RACLOZ et
al., 2012).
Geralmente, as intervenções de saúde pública
para dengue focam no vetor. Estas incluem emprego de inseticidas
multiagentes integrados como uma metodologia de controle de vetores e uma
ênfase na detecção precoce de casos, apesar de seus desafios (OMS,
2010). Embora possa haver um impacto positivo destas intervenções
impulsionadas, o controle integrado de vetores tem sido criticado por ser
amplamente ineficaz e oneroso e também por seu impacto negativo sobre o meio
ambiente devido à resistência a inseticida e toxicidade (TORRESI; TAPIA-CONYER; MARGOLIS, 2013).
Infelizmente, a falta de qualquer profilaxia
para a relação custo-benefício e tratamento direto significa que o controle de
vetores é atualmente a única resposta viável, apesar das críticas dessas
medidas (BÄCK; LUNDKVIST, 2013). Isto torna a evidente necessidade de esforços de
pesquisa renovada nas estratégias preventivas de saúde para tratar
dengue (TORRESI;
TAPIA-CONYER; MARGOLIS, 2013).
Os esforços de pesquisa para desenvolver uma
vacina contra a dengue estão em curso há mais de 70 anos; No entanto,
estes ainda estão em fases experimentais, e não há vacinas licenciadas (THOMAS, 2011).
Devido ao exposto, a dengue levanta
preocupações em relação especificamente ao aumento da incidência e gravidade
clínica desta. É uma preocupação crescente devido à propagação da dengue
através de viagens para destinos tropicais, sua intensificação, e pela falta de
uma vacina primária para prevenção ou tratamento. A incidência da doença e
o aumento da gravidade da dengue estão ocorrendo devido à globalização. A luta
contra a doença não foi suficientemente abordada no contexto da Pesquisa &
Inovação (P&D), apesar do panorama ilustrativo de que uma doença tropical
negligenciada pode se desenvolver rapidamente a partir de um problema regional
para uma preocupação global de saúde.
A doença de chagas também é uma das doenças tropicais
negligenciadas. O seu patógeno é o trypanosoma
cruzi, transmitido pelas fezes infectadas do inseto popularmente conhecido
como barbeiro. A contaminação também pode ocorrer por meio de alimentos e
transfusão sanguínea. A doença de Chagas é responsável por 14 mil mortes anuais,
de acordo com a OMS, que ainda informa que cerca de 10 milhões de pessoas têm a
doença na sua forma mais crônica, quando não há mais cura. Isso porque os
sintomas podem se manifestar até 30 anos após a infecção, quando a fase crônica
já está instalada. Apesar das campanhas de alerta contra os perigos do
barbeiro, os índices de transmissão quase não sofreram redução (SANTOS, 2014).
Os barbeiros possuem hábitos proeminentemente noturnos, particularmente
o Triatoma infestans, adaptaram-se
tão bem ao domicílio humano e a seus moradores que passaram a preferir o homem
para seus repastos sanguíneos e a morar e procriar na casa do homem. Adoraram
os longos, escuros e cálidos túneis das casas de pau-a-pique ou taipa, que se
erguiam por todo o território brasileiro. Ao se alimentar, o barbeiro defeca no
rosto que o alimenta. Em suas fezes estão tripanossomas infectantes que,
percorrendo o orifício da picada, chegam às células subjacentes que invadem
multiplicando-se. Células abarrotadas de tripanossomas arrebentam e os liberam para
o sistema circulatório aonde chegam a outras células (SANTOS, 2014).
No homem, os tripanossomas têm preferência por neurônios
do sistema nervoso autônomo e por células do miocárdio. A destruição gradual e
progressiva dessas células respondem pelos sintomas da doença crônica: lesões
do sistema motor do coração com arritmias, bloqueios e paradas cardíacas;
lesões das fibras cardíacas com diminuição de seu poder contrátil e
insuficiência cardíaca; lesões dos neurônios dos esfíncteres do esôfago e cólon
sigmóide que apresentam progressiva dificuldade de abertura, ocasionando a
formação de megaesôfago e megacólon. A morte pode ocorrer já na fase aguda ou
em qualquer momento da fase crônica, mas em geral a doença se estende por
muitos anos. O tratamento medicamentoso é complicado, pouco eficiente na fase
crônica da doença e com muitos riscos e efeitos colaterais (CAMARGO, 2008).
Outra doença tropical negligenciada é a leishmaniose, como
o próprio nome sugere, elas são causadas por patógeno do tipo leishmania e transmitidas pelo mosquito flebotominos (também conhecido como
mosquito palha) contaminado. Elas estão em 98 países, atingindo cerca de 350
milhões de pessoas. As leishmanioses são de dois tipos, a visceral e a cutânea,
e elas podem levar a óbito caso não sejam tratadas adequadamente. Os parasitas
desse patógeno, em geral, são animais domésticos, como cães e gatos, além de
animais silvestres (ALVES, 2001).
Epidemias curtas de leishmaniose visceral
(também conhecida como calazar) foram observadas nas cidades da América do Sul
a nordeste de São Luís e Teresina durante grandes secas causadas pelo El Niño
em 1983-1985 e 1992-1994 (HARHAY
et al., 2011). Tais eventos são exemplos de ocasiões temporárias onde é
mais vantajoso para o vetor flebotomíneo existir num ambiente novo,
possivelmente devido à breves diminuições dramáticas na umidade ou fornecimento
de alimentos em seu ambiente habitual (SRINIVASAN et
al., 2013).
Uma doença tropical negligenciada que merece destaque é a
esquistossomose. O patógeno desta enfermidade é o Schistosoma mansoni e a transmissão se dá através do contato com as
cercarias, que são liberadas por um caramujo de água doce do gênero Biomphalania. Estima-se que 2,5 milhões
de pessoas tenham a doença (SILVA et al.,2012).
Recentemente, a Fiocruz e o Instituto Osvaldo Cruz fizeram
testes clínicos para a primeira vacina contra a esquistossomose. Após 30 anos
de pesquisa a vacina foi aplicada em 20 pessoas. Todas foram imunizadas e não
houve efeitos colaterais. É a primeira vacina humana totalmente desenvolvida no
Brasil. A vacina passará agora para a fase 2 de testes clínicos, que envolverá
um número maior de pessoas, inclusive crianças, no Brasil e na África. Se tudo
der certo, a vacina ficará pronta para produção dentro de um prazo de 3 a 4
anos (FIOCRUZ, 2015).
No Brasil, desde 2003 houve melhora significativa nessa
área, mas ainda é muito pouco para alcançar as metas. O país é o sexto no mundo
que mais investe em pesquisas com doenças tropicais negligenciadas, e o
primeiro dentre os países subdesenvolvidos.
No entanto, antes de investir em pesquisas, é preciso
aprimorar os conhecimentos científicos a respeito dessas enfermidades, para que
a indústria farmacêutica possa desenvolver novas drogas de combate às mesmas,
drogas essas que não tenham custo elevado, de modo que toda a população possa
ter acesso. Além disso, também é necessário que os médicos recebam treinamento
ainda mais específico para tratar os pacientes que sofrem com essas doenças.
Três décadas após a declaração oficial da erradicação da
varíola pela Organização Mundial de Saúde (OMS) oferece esperança para alcançar
o progresso sustentado, também no que diz respeito à meta de eliminação para as
doenças tropicais negligenciadas (BERGQUIST et al., 2015).
No entanto, o progresso tangível para a eliminação de
doenças transmissíveis está distante - com exceção da poliomielite (LEE et al., 2012). Nesta
situação, a assinatura da Declaração de Londres - uma recente série de reuniões
que culminaram com a assinatura de uma declaração mutuamente vinculativa para
combater as doenças tropicais negligenciadas mais comuns do mundo com
base no roteiro da OMS para acelerar o trabalho para superar o impacto global
das doenças tropicais negligenciadas (“WHO Roadmap for Accelerating Work to Overcome the Global Impact of the
NTDs”) foi aprovada em 2011 (OMS,
2012).
Aspectos socioeconomicos,
ambientais e geográficos das doenças tropicais negligenciadas
Vários fatores geográficos, ambientais e
socioculturais podem predispor indivíduos a contrair doenças tropicais (MACKEY
et al., 2014). O clima entre o Trópico de Câncer e o Trópico de Capricórnio
é especialmente propício para vetores. Tendo em conta que mais de 40% da
população humana vivem atualmente nos trópicos, existe um elevado potencial de
risco de doenças tropicais negligenciadas na população mundial em geral e para
um aumento da prevalência, especialmente em regiões ausentes de maiores
esforços em saúde pública (OMS, 2010; MACKEY et al., 2014). Outros fatores também podem influenciar,
estes incluem ecologia e fatores ambientais mais amplos, como a mudança
climática e sua associação com alterações nos vetores das doenças, bem como a
falta de adequados esforços de saúde pública dirigida especificamente às
doenças nessas regiões (OMS, 2013).
Doenças tropicais negligenciadas estão bem
classificadas do ponto de vista socioeconômico. Segundo a OMS, as Doenças
tropicais negligenciadas impactam mais de um bilhão de pessoas (incluindo
um número estimado de 500 milhões de crianças) de quase 150 países e
territórios onde eles são endêmicas (OMS, 2010). Além disso, podem ser prevalentes em populações mais
pobres que vivem em países ricos, como os Estados Unidos (HOTEZ, 2013).
O impacto das doenças tropicais negligenciadas
é acentuado pela capacidade de cuidados em saúde inadequados ou ausentes,
especialmente porque muitas destas doenças estão associadas com doenças
crônicas e também são agravadas pela detecção ineficaz, más condições
ambientais, rápida urbanização, deficiências de saúde pública e a
pobreza (OMS, 2010).
A pobreza, em particular, é um determinante
social chave do descontrole da propagação das doenças tropicais negligenciadas
e pode levar à redução da produtividade econômica devido à incapacidade a longo
prazo e a morbidades, questões de saúde materno-fetal e materno-infantil, e
outros desafios relacionados com a saúde. (OMS, 2010; LIESE; ROSENBERG; SCHRATZ, 2010; HOTEZ;
PECOUL, 2010).
O impacto, portanto, é desastroso em ambientes
pobres sem recursos e tem sido associado com perturbações sociais mais amplas,
incluindo a instabilidade política, conflitos civis e desestabilização das
comunidades locais (HOTEZ;
PECOUL, 2010). Consequentemente, dado que os países
desenvolvidos têm relativamente baixa transmissão de doenças tropicais, isso
resulta na caracterização em doenças negligenciadas, afetando os mais pobres e
mais vulneráveis (LIESE;
ROSENBERG; SCHRATZ, 2010).
A eliminação de uma doença tropical também
pode ser complicada por problemas ambientais, como no caso das regiões que
apresentam ambientes benéficos para vetores, exigindo esforços de controle mais
agressivos e direcionados do que em regiões e ambientes menos favoráveis aos vetores (ALTIZER
et al., 2013).
Outros fatores estão relacionados aos
determinantes sociais da saúde, incluindo questões trabalhistas e de força de
trabalho, também pode ter um impacto. Famílias e comunidades que mais
frequentemente dependem de atividade ao ar livre para o trabalho e renda, como
a agricultura agrícola ou sustento, são mais susceptíveis a doenças tropicais
do que aqueles que estão envolvidos em outras profissões. Isso também está em
riscos associados com os indivíduos que não têm acesso à educação, que podem,
consequentemente, ser menos capaz de evitar exposições ocupacionais de maior
risco ou mais infecciosas relacionadas com a doença do que aqueles que
receberam maiores níveis de escolaridade (BOELAERT et al., 2013; TAHA;
SOLIMAN; BANJAR, 2013)).
Sistemas de vigilância
epidemiológica
Vigilância em saúde consiste em um conjunto de sistemas de
monitoramento, cada um com a responsabilidade de realizar coleta e análise de
dados. O objetivo é descobrir, investigar e interromper a transmissão
contínua, através de pacotes de resposta de saúde pública bem concebida que
incluem a prevenção da infecção e da doença (BERGQUIST et al., 2015). A divulgação quase em
tempo real dos resultados deve contribuir para melhorar o planejamento,
implementação e avaliação das práticas de saúde pública (LUKWAGO et al., 2012). Um
sistema de vigilância eficaz permite aos gestores identificarem áreas de risco
e / ou grupos populacionais afetados (TAMBO et al., 2014).
Um sistema de vigilância epidemiológica é um componente
importante nas atividades que antecedem a eliminação como evidenciado a partir
de trabalho sobre a malária em Zanzibar, República Unida da Tanzânia (SABOT et al., 2010) e
na República Popular da China (YANG et al., 2012a). Kelly e colaboradores (2011) publicaram
um exemplo eminente do uso de Sistemas de Informação Geográfica (GIS) para a vigilância
para a eliminação do paludismo, que também deve ser consultado.
A filariose linfática, por exemplo, não poderia ter sido
eliminado na China sem um sistema de vigilância de resposta eficaz (SUDOMO et al., 2010). A
detecção precoce de eventos incomuns é particularmente importante para uma
intervenção eficaz e oportuna e é fundamental para a orientação da seleção de
medidas corretivas adequadas para reduzir a transmissão (TAMBO et al., 2014).
No Brasil, o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (SINAN) vem
revelando-se representativo, permitindo conhecer a situação da doença no país.
O sistema de vigilância da dengue no Brasil vem apresentando consistência, com
valor preditivo positivo expressivo, oportuno para notificação de casos, capaz
de detectar tendência de mudança no perfil epidemiológico da doença (BARBOSA et al., 2015).
A mudança de foco do controle de mortalidade e morbidade
para a eliminação da transmissão da doença significa um movimento importante de
controle geral à eliminação e denota o tempo para uma aplicação gradual de um
sistema de vigilância. Segundo Bergquist et a (2015) depois de transição para o controle da transmissão, a
ênfase deve ser colocada sobre:
- Definição padrão para identificação da doença e
relatórios.
- Detecção, análise e confirmação dos surtos suspeitos e
investigação dos focos de transmissão contínua, recém-criados ou
reestabelecidos.
- Análise dos dados coletados para o monitoramento e
investigações de surtos; e seleção e implementação de atuações apropriadas,
adaptadas às particularidades de determinados pontos de acesso.
O desafio científico de estabelecer sistemas de
vigilância reside na criação e validação de dados mínimos, essenciais
necessários, e igualmente importante - quadro de amostragem mínima eficaz no
tempo e no espaço (BERGQUIST et al., 2015). De fato, visto nesta perspectiva, essa
abordagem seria uma aplicação mais oportuna também para doenças infecciosas
relativamente desconhecidas, por exemplo, o vírus Ebola (FRIEDEN et al., 2014). Os relatórios
do Centro Europeu de Prevenção e Controle das Doenças (ECDC), criado em 2005,
sobre o esforço atual para limitar o mais recente surto do Ebola na África
Ocidental (ECDC, 2014), indicam que informações epidemiológicas atualmente
disponíveis devem ser consideradas como insuficientes para avaliar plenamente a
extensão e dinâmica da epidemia.
Mudanças ambientais e variações de padrões sociais, como a
migração rural-urbana, alterações climáticas e mudanças nos padrões da doença
também devem ser levados em conta. As avaliações das alterações nos
padrões da doença são importantes para o projeto de estratégia da vigilância e
em verdade imperativos para conceber as atuações em saúde pública voltadas para
o controle da transmissão, e, portanto, infecções e doenças (BERGQUIST et al.,
2015).
Ferramentas para o progresso
sustentado
A maioria das doenças exigem abordagens específicas. A
chave para o progresso sustentado, que visa promover a melhoria de um cenário
antes que ela não seja mais possível, encontra-se em levantar todo o conjunto
de atividades de saúde pública para um nível superior ao invés de focar
exclusivamente no controle das doenças individuais.
Sistemas
de informação sanitária podem ser adaptados para facilitar o progresso da
vigilância em saúde e da promoção de saúde. Para realizar o controle das
doenças tropicais negligenciadas, ferramentas de reconhecimento e de
descoberta, tais como diagnósticos sensíveis, epidemiologia espacial e métricas
de saúde devem ser aplicados para reforçar a vigilância (UTZINGER et al., 2011).
A aplicação
do sistema de informação geográfica (GIS) e sensoriamento remoto de satélites
estão transformando o pensamento epidemiológico na direção das agendas de
investigação que oferecem soluções que guiam o desenvolvimento de sistemas
integrados de controle de doenças e vigilância (UTZINGER et al., 2011).
Plataformas
de software de código aberto baseado em tecnologia geoespacial foram
desenvolvidas e estão sendo cada vez mais utilizadas, para a avaliação de risco
a exemplo do monitoramento da dengue na Argentina (PORCASI et al., 2012) que fornece informações e atualizações regulares
sobre o ambiente viral, social e entomológico para cerca de 3000 cidades do
país e também fornece mapas de densidade para identificar o risco da
dengue. Esta plataforma é destinada principalmente a tornar-se uma
ferramenta de vigilância dinâmica para os investigadores coletarem dados de
campo. No entanto, é igualmente útil para os gestores de saúde e decisores
já que: apoia a rápida partilha de
informação a todos os níveis; e permite, ação de saúde pública orientada e
adaptada rapidamente.
Trata-se de uma
revisão de literatura, que segundo Gil (2008, p.50) “é desenvolvida a partir de
material já elaborado, constituída de livros e artigos científicos. Nessa
perspectiva, o presente trabalho foi desenvolvido nas seguintes etapas:
Foram
selecionados artigos científicos, publicados nos últimos anos (2009 até 2015)
nas bases de dados MEDLINE-NLM, MEDLINE-EBSCO, Scopus da Elsevier e SciELO. Como descritor foi utilizado: doença negligenciada
e sua respectiva tradução em inglês (Neglected
Diseases).
A seleção dos
estudos considerados relevantes foi baseada no título do estudo e resumo, e se
necessário, o documento completo. Para ser considerado nesta revisão era
necessário que os estudos fossem publicados em português ou inglês e estivessem
disponibilizados na íntegra de modo que a qualidade metodológica do estudo
poderia ser avaliada em conjunto com os resultados. Como critérios de
exclusão teve-se publicações no formato teses, dissertações, capítulos de
livro, as que não tinham relação com o tema da pesquisa, bem como as que
tratavam de estudos realizados fora do Brasil.
Foram
identificados um total de 45 registros através da pesquisa de banco de dados
dos quais 17 foram considerados considerados potencialmente relevantes e
respeitados os critérios de inclusão e exclusão anteriormente citados. Destes,
quatro artigos foram removidos como duplicados e obtivemos 13 artigos
elegíveis. Este estudo incluiu oito artigos originais.
Analise e interpretação dos dados
Foi realizada a
leitura analítica avaliando os objetivos, metodologia empregada, resultados e
principais conclusões de cada estudo com a finalidade de obter as respostas
objetivadas. Os artigos selecionados
foram avaliados em texto completo, observando-se então se de fato atendem aos
objetivos da pesquisa.
Realizou-se um fichamento das publicações selecionadas e
fizeram-se leituras críticas, com o objetivo de responder à questão condutora.
Dessas leituras, obteve-se categorização temática de acordo com conteúdo
encontrados nas publicações.
Doenças zoonóticas
negligenciadas são um subconjunto das doenças tropicais priorizadas pela OMS que são transmitidas entre seres
humanos e outros animais vertebrados. A transmissão destas doenças
zoonóticas pode ser direta ou indireta através de vetores, tais como mosquitos,
carrapatos, reservatórios animais, ou outros agentes zoonóticos presentes na
água, alimentos e solo (INSTITUTE OF MEDICINE FORUM ON MICROBIAL THREATS, 2011).
Mais do que um problema para a saúde, as doenças
negligenciadas configuram um entrave ao desenvolvimento humano e econômico das
nações. (Fiocruz, 2014). Nesse cerne, a Tabela 1
apresenta dados estatísticos sobre os agravos de algumas doenças negligenciadas,
onde os dados mais proeminentemente elevados referem-se a Dengue, Malária e
Tuberculose. As estatísticas envolvem, pelo menos, dois bilhões de pessoas ocorrendo
em mais de 90 países (quase 50,0% do total de países no mundo).
Tabela 1. Dados estatísticos sobre os agravos das
principais doenças negligenciadas no Brasil e no mundo.
Doença |
População
sob risco |
Novos
casos/ano |
Dengue |
2,5 bilhões em 100 países. |
entre 50 e 100 milhões de novos
casos/ ano no mundo e 765.000 no Brasil. |
Doença de
Chagas |
25 milhões de pessoas em 21 países. |
56 mil novos casos / ano e 166 no
Brasil. |
Esquistossomose |
800 milhões em 77 países e
territórios. |
230 milhões de novos casos/ano no
mundo |
Hanseníase |
---- |
219.000 novos casos / ano no mundo e
34.000 no Brasil. |
Leishmaniose |
350 milhões de pessoas em 98 países. |
Cerca de 1,8 milhão de casos (1,5
milhão de Leishmaniose Cutânea - LC e 300 mil de Leishmaniose Visceral - LV)
/ ano. No Brasil, 3.500 de LV e 22.000 de LC. |
Malária |
3,2 bilhões de pessoas em 99 países. |
Cerca de 200 milhões de casos / ano
no mundo e 300.000 no Brasil. |
Tuberculose |
2 bilhões de pessoas em 95 países. |
8,8 milhões de novos casos / ano e 69
mil no Brasil. |
Fonte: Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz, 2015).
O controle e gerenciamento
integrados são importantes dados o impacto desproporcional sobre os pobres,
possível subnotificação da incidência, disponibilidade de simples e
relativamente ferramentas e estratégias para o controle de baixo custo, e que
apresentam uma dupla carga de doenças em seres humanos e animais. Sete das
17 doenças tropicais negligenciadas são identificados como zoonóticas, segundo
OMS: a raiva, a tripanossomíase, leishmaniose, teníase / cisticercose,
equinococose, trematodiases de origem alimentar e esquistossomose (OMS,
2011). Dessas, a raiva e a tripanossomíase também são consideradas doenças emergentes
e reemergentes ao lado de outras doenças como Chagas, Cisticercose e Dengue.
Doenças tropicais
negligenciadas emergentes e reemergentes é uma agregação de estados de doença
que são significativos devido aos desafios associados à sua prevenção e
tratamento, sua expansão geográfica, e seu impacto negativo sobre a economia e
do progresso social (MACKEY;
LIANG, 2012). Especificamente, eles são
um subconjunto das 17 doenças tropicais negligenciadas identificados pela OMS,
que também são classificados pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC) como doenças infecciosas emergentes e
reemergentes.
Cinco doenças tropicais negligenciadas
emergentes e reemergentes específicas são identificados: dengue, doença de
Chagas, cisticercose, a tripanossomíase humana Africano, e raiva (MACKEY; LIANG, 2012). Três dessas doenças adentraram a agenda
de prioridades da OMS (Cisticercose, Tripanossomíase e Hidrofobia, vulgo Raiva).
A Tabela 2 fornece uma lista e resumo de algumas das principais
características das doenças tropicais negligenciadas emergentes e
reemergentes identificadas.
Tabela 2. Característica das doenças tropicais
negligenciadas emergentes e reemergentes.
Doença |
CDC e/ou NIH, |
Prioridade da OMS |
Classe (agente da doença) |
Agente etiológico |
Vetores animais / reservatórios |
|
Doença de Chagas |
CDC |
Não |
Parasita (protozoário) |
Trypanosoma cruzi |
Triatomíneos (gêneroTriatoma) |
|
Cisticercose |
CDC |
Sim |
Parasitárias (helmintíases) |
Taenia solium |
Porcina (família dossuídeos) |
|
Dengue |
CDC e NIH |
Não |
Viral |
Flavivírus |
Mosquito(Aedes aegypti) |
|
Tripanossomíase humana africana |
CDC |
Sim |
Parasita (protozoário) |
Trypanosoma gambiense; Trypanosoma rhodesiense |
Mosca tsé-tsé (gênero Glossina) |
|
Raiva |
CDC e NIH |
Sim |
Viral |
O vírus da raiva |
Múltiplos vetores animais
(por exemplo, gênero Canise família dossuídeos) |
Fonte: OMS (2011).
A Tabela 3
apresenta a políticas para dengue, doença de Chagas, cisticercose, a
tripanossomíase humana Africana e raiva.
Tabela 3. Políticas ambientais para as doenças
tropicais negligenciadas emergentes e reemergentes.
Doença
tropical negligenciada emergente e reemergente |
Resolução específica da doença segundo AMS(ano) |
Objetivos e metas para 2015 e 2020, segundo OMS |
Exemplos de iniciativas específicas |
Doença de Chagas |
AMS 51.14 (1998):
"eliminação da transmissão da doença de Chagas"; AMS 63.20 (2010), "A
doença de Chagas: controle e eliminação" |
2015, de transmissão regional
através de transfusão de sangue interrompeu; 2020, a transmissão
intradomiciliar Regional interrompida na região das Américas. |
Parcerias globais,
iniciativas lideradas pela OMS-e OPAS (por exemplo, a OMS Rede Global de luta
contra a doença de Chagas); doações de medicamentos pela Bayer e Sanofi. |
Cisticercose |
Sem resolução específica. |
2015, estratégia validada
para controle e eliminação; 2020, intervenções reforçadas nos países
selecionados para o controle e eliminação. |
Parcerias mundiais, grupos de
trabalho na Europa, na África Oriental e Austral; desenvolvimento de
medicamentos. |
Dengue |
AMS 46.31 (1993),
"prevenção e controle da dengue"; AMS 55.17 (2002),
"Prevenção e controle da dengue e dengue hemorrágica". |
2015, as intervenções de
controle de vetores sustentáveis estabelecidos em 10 países prioritários de endemicidade; 2020,
sistema de controle e de vigilância estabelecida em todas as
regiões. Casos reduzidos em mais de 25% e mortes reduzidas em 50%. |
Iniciativas da OMS: Dengue
Vaccine Initiative (DVI). Projeto de desenvolvimento de medicamentos
pela Sanofi Pasteur: “ Pediatric Dengue Vaccine Initiative”. |
Tripanossomíase Africana humana |
AMS56.7 (2003), "Mosquito
tsé-tsé e a campanha de irradiação"; AMS57.2 (2004),
"Controle da Tripanossomíase Africana humana" |
2015, a eliminação de 80% dos
focos. |
Parcerias globais, a
colaboração da OMS com o Programa Africano contra a Tripanossomíase (PAAT); doações
de medicamentos. Bayer e Sanofi: desenvolvimento de medicamentos. |
Raiva |
AMS3.20 (1950),
"Rabies" |
2015, eliminação regional na
América Latina; 2020, a eliminação regional nas regiões do Sudeste
Asiático e Pacífico Ocidental |
Parceria Global para a
prevenção da Raiva (Global Alliance for Rabies Control iniciativa) |
* Assembléia Mundial da Saúde (AMS) (o corpo da
OMS de tomada de decisão)
Fonte: MACKEY et al., 2014
Tabela 4. Padrões demográficos regionais de
incidência de dengue: dados da razão homem/mulher e de distribuição da idade
Autor (ano) |
Cidade ou Estado (Região) |
Ano |
Razão homem/ mulher |
Faixa etária em anos* |
|
||||
|
< 10 |
10-19 |
20-39 |
40-59 |
≥60 |
|
|||
BORGES et al., 2014* |
Cidade: Ariquemes (Norte) |
2002 |
0,839 |
[28,2] |
|
||||
2003 |
|
[100,4] |
|
||||||
2004 |
|
[179,5] |
|
||||||
2005 |
|
[832,6] |
|
||||||
2206 |
|
[66,7] |
|
||||||
2207 |
|
[15,8] |
|
||||||
2008 |
|
[122,9] |
|
||||||
2009 |
|
[723,6] |
|
||||||
2010 |
|
[252,2] |
|
||||||
2011 |
|
[30,6] |
|
||||||
CAVALCANTI et al., 2011 (39) |
Estado: Ceará (Nordeste) |
2000 |
|
[65.4] |
[129.3] |
[263.6]** |
[194.8] |
|
|
2001 |
|
[174.7] |
[321.3] |
[659.3]** |
[423.4] |
|
|||
2002 |
|
[18.5] |
[160.6] |
[304.3]** |
[223.3] |
|
|||
2003 |
|
[128] |
[250.4] |
[416.9]** |
[313] |
|
|||
2004 |
|
[14.3] |
[34.3] |
[53.6]** |
[39.1] |
|
|||
2005 |
|
[126.5] |
[198.2] |
[365.2]** |
[441.5] |
|
|||
2006 |
|
[116] |
[247.9] |
[412.6]** |
[422.2] |
|
|||
2007 |
|
[236.7] |
[305.6] |
[331.5]** |
[249.9] |
|
|||
2008 |
|
[599.4] |
[574.4] |
[521.9]** |
[301] |
|
|||
CARDOSO, 2011 |
Cidade: Vitória (Sudeste) |
2000-2009 |
|
7,27% |
17,7% |
44,1% |
24,4% |
6,46% |
|
DA SILVA, 2009 (41) |
Cidade: Goiânia (Centro-Oeste) |
2005 |
|
16,9% / 4,79%+ |
19,9% / 14,4%+ |
36,8%/ 44,9%+ |
20,2% / 24,5%+ |
5,24%/ 9% + |
|
2006 |
|
13,1% / 8,47%+ |
18,1% / 17,7%+ |
36,6%/ 44,9%+ |
22% / 20,5%+ |
9,63%/ 8,47%+ |
|
||
2007 |
|
6,78% / 12,6%+ |
11,9% / 16,6%+ |
37,9%/ 39,4%+ |
33,9% / 23,6%+ |
8,5%/ 7,85%+ |
|
||
HINO et al., 2010 (47) |
Cidade: Ribeirão Preto (Sudeste) |
2001 |
0.811 |
|
|
|
|
|
|
2002 |
0,893 |
|
|
|
|
|
|
||
2003 |
0,949 |
|
|
|
|
|
|
||
ROMANO et al., 2010 (54) |
Cidade: Santos (Sudeste) |
2010 |
0,5 |
5,6% |
5,6% |
38,9% |
50,0% |
|
|
*Dados da Faixa Etária são apresentados como porcentagem
de um total de casos ou [incidência por 100.000 habitantes]. No estudo de
Borges et al., 2014, os dados não
foram apresentados segundo a faixa etária.
**Faixa Etária dos 20-59 anos
+ Resultados de dois diferentes sistemas: Sinan e
SIH/SUS, nessa ordem.
Fonte: Dados da pesquisa em bases de dados
A existência destas doenças
aumenta a importância de ecologias amplas que influenciam a proteção das
populações humanas, a necessidade de fiscalização de vetores animais, e a
realidade que eles são especialmente difíceis de controlar ou eliminar devido
aos seus reservatórios não-humanos (KARESH et al., 2012). Nesse cerne, algumas Políticas ambientais
foram desenvolvidas (Tabela 3), tendo em vista o interesse pelo tema desde
1948, quando a Assembleia Mundial da Saúde (AMS- corpo da OMS de tomada de
decisão) emitiu pela primeira vez uma resolução reconhecendo a necessidade de
uma ação internacional para tratar doenças transmitidas por vetores (OMS,
2013).
Desde então, foram adotadas
numerosas resoluções da AMS, abordando a prevenção, vigilância, controle,
eliminação e erradicação, fornecimento e uso de inseticidas, intensificação de
investigações, prevenção e controle das doenças associadas com alimentos,
abastecimento de água, problemas de saneamento e a questões ambientais,
incluindo poluentes orgânicos. Além disso, as parcerias públicos-privados passaram
a apoiar o financiamento de doenças infecciosas, a investigação e o desenvolvimento
da atividade na (P&D) nos chamados “países em desenvolvimento
inovadores", como o Brasil, China, Índia e Indonésia, onde as doenças
tropicais negligenciadas também são endêmicas (HOTEZ, 2013).
No Brasil, muitos dos
esforços tem se direcionado para o controle da Dengue, tendo em vista os dados
alarmantes nos últimos anos (Tabela 4 e Figura 1).
Dados de incidência relacionados com gênero, faixa etária
e regiões de cinco estudos eleitos (n=5) apresentam comparações inter-regionais
esparsas e difíceis (Tabela 4). Os dados mais completos são para
os períodos 2001-2008 (CAVALCANTI et al.,
2011) e 2002-2011 (BORGES et al.,
2014). Em 2001, a maior incidência dos casos ocorreu em pessoas com idades
entre 20-59 anos, enquanto que na epidemia nacional de 2008, aqueles mais
afetados tinham idade inferior a 10 anos (CAVALCANTI et al., 2011). Estes dados refletem as mudanças nacionais na
distribuição etária da doença da dengue. Dados mais alarmantes são evidenciados
na cidade de Ariquemes (Região Norte), onde a incidência alcançou o pico de
832,6 no ano de 2005 e 723, 6 no ano de 2009, tendo decaído desde então. Algumas das explicações possíveis para tais
picos epidêmicos registrados no ano de 2005 e 2009 poderiam ser novos sorotipos
virais que tenham advindo ao município, infectando a população (BORGES et al., 2014).
Em relação à incidência por regiões é possível observar
variações ao longo do período 2009-2013, como exemplificado na Figura 1. A
região centro-oeste apresentou maior aumento (375%), no ano 2013 em relação a
2012, sendo que esta região tem constantemente a incidência elevada. Já a
região nordeste foi a única a apresentar redução no ano de 2013, em relação ao
ano de 2012 (diminuição de 44%). A região Sul, apresentou ao longo do período,
menores índices do que as demais regiões, sendo que no ano de 2013 as
incidências das regiões Nordeste, Sul e Sudeste foram próximas.
Figura 1. Incidência de Dengue no Brasil, segundo as regiões.
Fonte: BRASIL ( 2015).
A dengue tem acometido pessoas de ambos os gênero, contudo
os estudos incluídos na Tabela 4 apresentam maiores incidências em mulheres do
que em homens (HINO et al., 2010;
ROMANO et al., 2010). Dados de estudo
nacional, realizado em Vitória/Espírito Santo, corroboraram com os achados as
pesquisas anteriores ao apresentaram a prevalência no gênero feminino (54%)
como superior ao masculino (46%). A hipótese mais provável refere-se ao fato
das mulheres habitualmente ficarem mais tempo no ambiente domiciliar, onde boa
parte das infecções acontece (VICENTE et
al., 2013).
O fator ambiental desempenha influência na proliferação do
Aedes aegypti, que apresenta hábitos domiciliares
peridomiciliares, fato que explica os grandes índices de incidência nas regiões
nacionais. O Brasil apresenta território com grandes extensões urbanas e,
portanto, possuem aglomerados populacionais e clima propício, eventos estes que
favorecem uma maior presença do vetor, e consequentemente maior quantidade de
casos de dengue (MARQUES; SERPA; BRITO, 2008). Outra explicação para a elevação da incidência
refere-se à significativa parcela da população brasileira que vive em
habitações com má infraestrutura, e pelo clima da região faz-se necessário o
armazenamento de água, sendo boa parte de forma inapropriada. A má administração
dos serviços de saúde inclui a falta de investimentos em prevenção e em
tratamento adequados, resultando também em fator contribuinte para o aumento
dos casos (CHIARAVALLOTI et al.,
2012).
Lacunas importantes em nossa compreensão da epidemiologia
e controle de muitas das doenças tropicais negligenciadas permanecem, o que
exige financiamento adicional, de modo que uma investigação inovadora permitirá
a elaboração de novas ferramentas e estratégias que possam ser validadas e aplicadas
no campo de pesquisa.
Devido à importância crescente das doenças tropicais
negligenciadas os esforços devem ser praticados por sociedades e redes
científicas (por exemplo, Rede de Educação para a Saúde Internacional) para
treinar e informar os profissionais sobre a prevenção, diagnóstico, tratamento
e gestão de doenças tropicais negligenciadas, incluindo encaminhamento adequado
quando necessário. Vale salientar que muitas das infecções são facilmente e
eficazmente tratadas com regimes orais de fármacos e outras são facilmente
preveníeis, ao exemplo dramático da dengue.
A vigilância epidemiológica da dengue não é desenvolvida
de forma sistemática no Brasil. Neste sentido, cabe os profissionais de saúde
pública e de cuidados de saúde desempenham um papel importante na redução do
risco de transmissão. A introdução de novos protocolos para a vigilância
epidemiológica das doenças transmitidas por vetores, em especial a dengue,
entre esses profissionais será fundamental para avaliar o risco em cada
elemento de área. A detecção precoce, confirmando qualquer caso suspeito o mais
rápido possível e oportuno relatório, permitir uma boa gestão dos casos e a
tomada de medidas preventivas para reduzir ou eliminar a probabilidade de
disseminação do Aedes. Além de tudo,
as atividades de saúde da comunidade e avaliação do risco para a população são
essenciais para alcançar o compromisso da comunidade, reduzindo a presença do
vetor e implementando medidas de proteção individual contra as picadas de
mosquito. Destarte, a coordenação de saúde pública de todos os setores
envolvidos é essencial para o bom funcionamento de um plano abrangente para
responder às doenças transmitidas por vetores.
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[1]
Graduanda em Medicina pelo Centro Universitário de João Pessoa (UNIPÊ).
E-mail: thay_sarmento@hotmail.com
[2]
Doutoranda em Inovação Terapêutica pela Universidade Federal de Pernambuco
(UFPE). E-mail: thassysarmento@hotmail.com
[3]
Graduando em Medicina pela Faculdade de Medicina Estácio Juazeiro do Norte
(FMJ).
E-mail: salomaolramalho@gmail.com